quarta-feira, 28 de abril de 2010

O adeus...

A Santa Fe virou mão dupla, o andar 17 do edifício onde eu trabalhei dois anos está sendo redesenhado, um monte de gente se casando... Realmente, é o fim de um ciclo. O momento exato para começar a escrever minha história de novo, em outro lugar.

No entanto, o processo de ir embora e deixar o passado recente não é tão fácil como eu imaginava. A melancolia bate calada e tudo é motivo para se lembrar de algo, uma recordação de um bom momento. Pra se ter idéia do quanto estou sensível, hoje fechei a conta no banco e, quando o rapaz rompeu meu cartão, me deu uma dor no coração. Parece que cada medida que tomo para a mudança tem o efeito de um golpe. Neste instante, minha visão é do meu apartamento vazio e malas cheias num canto. Não pensava que seria assim, mas isso dói.

Os dias que antecedem minha partida de Buenos Aires estão cheios de lágrimas, despedidas e surpresas. Meus amigos do escritório elaboraram um lindo presente de despedida, que me emocionou. Cartinhas escritas por cada um, uma foto de todo o grupo e dim dim (eles sabiam que minhas malas estão cheias e não entraria nem um grão mais). Muito sábios!

Bom, não precisa nem dizer que, ao ver a foto, minhas lágrimas já começaram a rolar... Há pessoas que exerciam o papel de minha família aqui, com os quais eu passava horas e horas do meu dia, todos os dias. Compartimos risadas, choro, momentos de ira e de piadas. Ouso até dizer que vou sentir saudades das músicas do Cristián. Meu Deus, é grave o que acabei de escrever! Hahaha...

A última noite inclui fechar as malas, tirar todos meus objetos do apartamento e passar esses últimos momentos aqui sozinha com meus pensamentos. Mas há lugar para mais surpresas. Eis que ouço, às 23h30, meu interfone tocar. Quem poderia ser a essa hora? Era o mocinho que trabalha na sorveteria no terreo do meu prédio, que queria me presentear com ¼ de sorvete. Pode ser que eu seja muito manteiga derretida, mas essa atitude tocou meu coração profundamente. Senti-me querida e vi que os cumprimentos sempre que passava em frente à sorveteria, a simpatia e a amabilidade podem fazer diferença no dia-a-dia. O que pode significar um pote de sorvete ou uma cartinha? Para muitos, nada especial, mas pra mim resume esses quatro anos aqui em Buenos Aires.

Encaro esta despedida como a separação de um casal. Como dois amantes, há muitas coisas das quais me arrependo ou gostaria de ter feito de forma diferente e outras que vão deixar saudades. Buenos Aires é o amor que fica e se despede, enquanto eu sou o outro lado do casal, que faz as malas e vai tentar outra sorte, com uma história intensa na bagagem.

Adiós!

domingo, 25 de abril de 2010

Último domingo

Buenos Aires vai me dando seu adeus de maneira cinza e fria. Este foi meu último domingo aqui, afinal, quinta-feira que vem estarei partindo para o Brasil, rumo a um futuro incerto. Neste momento, tudo parece ter gostinho de despedida. Passeio pelos cafés, pelas ruas, para usufruir ao máximo da vida porteña e talvez poder viver o que não vivi ou não aproveitei durante esses quatro anos.

Não chego a sentir arrependimento com relação à minha decisão de ir embora, mas estou certa de que as coisas estão rolando de maneira muito rápida e não estou tendo tempo para desfrutar esses últimos dias aqui como eu gostaria. São emoções desencontradas. Ao mesmo tempo que quero chegar logo ao Brasil e ver minha família, sinto que minha partida será como romper um cordão umbilical. Nunca será igual. Por mais que eu volte a passeio, não será igual.

Vejo minhas malas pela sala e meu apartamento quase vazio, só com alguns poucos objetos dentro dos armários, e, devo admitir, dá um nó na garganta. Passei bons e maus momentos aqui. São três anos e meio de sábados à noite sozinha neste apartamento só com a companhia de uma pizza e um DVD, de reunião com amigos, de amores mal resolvidos e outros arrebatadores...

Se alguém perguntar o que é Buenos Aires para mim, vou responder que é o todo. É a soma do meu cantinho aqui na Avenida Coronel Díaz, dos meus amigos, da rotinha que eu tinha aqui. Esse post de hoje anda meio melancólico, mas reflete como me sinto hoje, num domingo que parece ter um sorriso quase inexistente. Ando segurando a emoção, porque as lágrimas não valem a pena. Como gosto sempre de citar letras de música que tenham a ver com meus posts, deixo um trecho da canção “Basta ouvir seu coração”, do Ivan Lins e Maurício Manieri, que fez parte do desenho animado “Tigrão”. Se puder, ouça. É muito linda.
Tchau e boa semana!
Basta ouvir teu coração

O Sol quente das manhãs
As noites de luar
A vida é tudo o que se quis
Um canto de amor
Mas de repente não há mais música no ar
E tudo é diferente do que você sonhou.
Se você sentir a solidão da escuridão
Pense em quem te faz feliz
A amizade tem um querer bem
Que esteja onde estiver
Tudo vai ser como é
Basta ouvir seu coração
As lembranças vão surgir
É só você buscar
Abraços e sorrisos
Que ninguém pode apagar
Vão relembrar histórias que você já se esqueceu
Ninguém está sozinho
Se não existe adeus
Se você sentir a solidão da escuridão
Pense em quem te faz feliz
A amizade tem um querer bem
Que esteja onde estiver
Tudo vai ser como é
Basta ouvir seu coração
Há um lugar em você
Onde está a alegria de viver
Preste atenção no que essa voz diz
Em seu coração
Você não vai se perder

domingo, 18 de abril de 2010

Seleção do melhor e do pior de Buenos Aires

Na semana que passou, mais precisamente dia 15 de abril, completei quatro anos em Buenos Aires. Para alguns pode parecer muito tempo, para outros nem tanto. Só sei que nesse período, vi, vivi, comi, tomei, andei e experimentei um sem fim de experiências aqui. Por isso, nessa reta final, achei que seria legal fazer uma lista das coisas que mais gostei e das que menos gostei em Buenos Aires. Vamos lá!

· Os parques: Buenos Aires tem parques lindos, pequenos, enormes, de todos tipos, espalhados por toda a cidade. Nos dias de sol é muito legal sentar na grama, fazer um pic nic ou somente curtir a natureza ao redor.

· O sorvete: Meu Deus, o sorteve daqui é muito bom! Há os mais diversos sabores e, entre eles, o doce de leite é o mais tradicional. Pra ter uma idéia da potencia do meu consumo de sorvetes durante esses quatro anos, basta mencionar que há uma sorveteria no térreo do prédio onde eu moro e os rapazes que trabalham alí sabem meus gostos preferidos melhor que eu mesma.

· As massas: Aqui se chamam “pasta”. As massas, na sua maioria, são artesanais e deliciosas. Minha preferida é o sorrentino. Não há um tipo de massa no Brasil que corresponda ao sorrentino, ou seja, vou sentir saudades...

· Os elogios: Imagine a típica cena – mulher passando em frente a uma construção. Logo vêm à mente um monte de cantadas impronunciáveis, certo? Errado, pelo menos aqui em Buenos Aires. Pelo menos as vezes que eu tive a oportunidade de passar por uma obra, escutei coisas meigas como “hermosa” ou “bombón”. Não fere o ouvido de ninguém. Ao contrário, levanta o ego da mulherada. Então, um viva para as cantadas nas construções porteñas!

· Palermo: Não me refiro ao jogador de futebol, mas ao bairro onde morei desde que me mudei a Buenos Aires. Adoro aqui! Tem de tudo perto, as pessoas são bonitas e o nível de segurança ainda é um dos melhores da cidade. Sempre tive um pouco de resistência quando o assunto era me mudar de Palermo e tudo me leva a acreditar que eu tinha razão, afinal, esse bairro é a minha cara!

· O inverno: Faz muito frio aqui no inverno. Acredite em mim! Alguns anos são mais gélidos que outros, mas, em geral, é frio mesmo. Em 2007 nevou na Capital Federal e eu só faltava ter gelinho pindurado na orelha e nariz. Depois de um verão infernal (odeio o verão aqui, mas isso vou comentar mais adiante), o outono e primeiros meses do inverno são como refrescos para a alma. Além disso, é a oportunidade perfeita para usar casacos lindos, sobretudos, boinas, luvas e cachecóis. No fim do inverno já estamos todos de saco cheio das baixas temperaturas, mas isso já é outra história.

· Mocinhos: Os rapazes, pelo menos os porteños (não sei falar do resto do país porque viajei muito pouco dentro da Argentina), são lindos. Verdadeiros colírios para os olhos femininos. São muito frescos pro meu gosto, porque gostam de ser ignorados pelas mulheres, mas na aparência, carimbo e assino embaixo.

· As propagandas: Até me arrisco a dizer que os intervalos comerciais aqui são entretidos, porque a publicidade é criativa e, na maioria das vezes, engraçada. Um exemplo é a do bebê que vê a mãe conversando com a planta, fica com ciúme e quer ir embora de casa. Hilária! Fazia parte da campanha da Personal para o Dia das Mães em 2007. Aqui está o link: http://www.youtube.com/watch?v=n0dXKhjVfhc&feature=related. Essa daqui também é muito legal: http://www.youtube.com/watch?v=bMbGjZEBId4 .

· Bajofondo Tango Club: Forte, apaixonante. Assim poderia descrever a música desse grupo, comandado pelo talentoso Gustavo Santaolalla. Vale a pena escutá-los. Os arranjos presentes nas canções cumprem com uma das missões que a música tem ao ser criada por um autor: gerar sensações em quem as ouve. Na minha opinião, é a melhor música da Argentina e a representa muito bem.

Estão, também as coisas que não aprovei em Buenos Aires e vou preferir não me lembrar delas quando já não estiver mais aqui.

· Jornalismo: Mesmo sendo jornalista, acho que não sou tão exigente nessa questão, mas o jornalismo na Argentina não me agrada em nenhum aspecto. Nenhum! No jornal impresso sempre falta uma das informações básicas. Se a notícia é sobre um show que está por chegar à cidade, certamente, vai faltar algum dado, como onde vão fazer o espetáculo ou a data em que a banda está tocando na cidade. Já o jornalismo televisivo me revolta. O pratinho com medias lunas sobre a bancada no estúdio eu posso suportar, mas os apresentadores mandando beijinhos e fazendo piadinhas pessoais entre eles, acho que já é demais. Além disso, quando a matéria é sobre um crime, mostram a casa da vítima e do suspeito, com direito ao endereço completo. Falta ética, falta noção.

· Manifestações: Até a semana passada a rotina era sempre a mesma. De manhã me levantava, ligava a televisão enquanto me preparava para ir trabalhar. Aproveitava para escutar as notícias e a agenda dos protestos do dia pela cidade. É isso mesmo! Você não leu errado. As manifestações populares, dessas que bloqueiam as ruas e promovem o caos urbano, são divulgadas para que as pessoas possam evitá-las, se possível... São cerca de cinco marchas por dia, nas principais artérias da cidade. Tive a péssima oportunidade de ter que cruzar algumas delas e, em alguns momentos, é assustador, com pessoas com bastões de madeira e o rosto coberto. O que mais me revolta é que, na maioria das vezes, são movimentos sem um motivo concreto e a maioria das pessoas envolvidas não tem nem a mais pálida idéia do que está fazendo alí. Já os escutei reclamando sobre a situação dos Palestinos etc. Uma vez um jornalista fez uma pesquisa e saiu perguntando aos manifestantes a razão do protesto e... adivinhe???? Não sabiam, claro!

· Histeria: Isso já foi o tema de um post do meu blog, quando ainda estava hospedado no UOL. Queria esclarecer uma coisa: não se trata de gritaria ou nervos descontrolados, como muitos devem imaginar. O que chamam de histeria aqui é a típica situação em que o homem ou a mulher demonstram que não estão a fim quando, em realidade, estão. Seria o velho conhecido “não %¨&* e nem sai da moita”. Segundo o pessoal aqui, é uma espécie de estratégia para conquistar o outro. Eu, particularmente, não consigo entender esse comportamento, então resolvi nunca entrar nesse jogo. Bom, vejo que aqui quem não “histeriquea” não leva o troféu pra casa, mas mesmo assim, prefiro ser eu mesma. Direta e sincera.

· Cortes de cabelo: Mulets! Oh, my God! Homens tão bonitos com cabelos que ficaram presos nos anos 80. Na maioria das vezes são descabelados, sem corte e com aquele “rabinho” atrás. Uma verdadeira pena... Mas as mulheres não estão a salvo. Há cada corte de cabelo... Jesus! Repicado do topo da cabeça até a ponta da melena. Parece que o cabelereiro tinha mau de parkinson. Um horror!

· Calor: O que tem a primavera e o outono de agradáveis, tem o verão de insuportável. Calor, associado à altíssima umidade do ar, é igual a quase desmaio, suor e mau humor. Sem contar no metrô lotado e todos transpirados. Um nojo.

· Mau humor das vendedoras: Odeio entrar a uma loja em que haja duas vendedoras conversando entre si e que nenhuma me dê a mínima atenção. Simplesmente viro, dou as costas e vou embora. Parece que estão alí fazendo um favor para o cliente. Está também a situação em que a vendedora está dobrando roupas e prefre continuar essa tarefa em lugar de vender.

· Taxistas: Para conseguir um taxista que seja simpático e não dê golpes ou passeie você pela cidade é necessário uma boa dose de sorte. A última que aconteceu comigo foi revoltante. No fim de semana de Páscoa, depois de três dias passando mal em casa, decidi tomar um taxi e ir para o hospital. Chegando na porta da emergência, dei uma nota de 50 pesos. O taxista começou a gritar comigo porque eu não o havia avisado que ia pagar com uma nota de 50. Vamos lá, 50 pesos não é um valor tão alto assim e ele tinha que me devolver 40. Por isso, rodei a baiana ali mesmo. Afinal, tomei um taxi porque não podia andar e, naquela altura do campeonato, tinha que buscar troco para ele. Só o que me faltava! Consegui o troco num estacionamento ao lado e joguei os 40 pesos dentro do taxi. Falta de educação da minha parte? Certamente, mas a minha ira falou mais alto.

· Férias de 15 dias: A frase que mais aplica aqui seria “Ninguém merece!”. E é verdade. Poxa, vida. 15 dias de férias nos primeiros cinco anos na empresa é injusto e quase um castigo. Eu, por exemplo, usava essas duas semanas para ir visitar minha família no Brasil. Ou seja, não tinha condições de viajar a nenhum outro lugar.

· Derecho de piso: Quando escutei falar sobre o “derecho de piso” quase não acreditei. É quase como um trote de faculdade, em que os veteranos tem mais direitos e ditam as regras. Acredito no direito comum, se todos trabalham na mesma empresa, estão alí como equipe e, se começamos a fazer diferença entre as pessoas por tempo na companhia, não é igualdade.

domingo, 11 de abril de 2010

Último dia no escritório



No escritório, a cada momento que me sentia estressada ou triste, olhava pela janela ao meu lado e ficava vendo os barcos no Río de la Plata. Era uma válvula de escape, pois me sentia justo aí, no meio do rio, longe dos meus problemas. Tive momentos no trabalho que me deixaram praticamente louca, e faziam com que eu quisesse sumir do mapa.

Sexta-feira passada foi meu último dia na empresa. Pensando no que eu descrevi logo acima, seria normal pensar que me senti aliviada, não? Mas, na verdade, me emocionei e tive que conter as lágrimas no elevador ao subir ao 17° andar. É estranho. Sentada em minha mesa me dei conta de que a sensação era de que na segunda-feira estaria alí de volta e tudo seguiria igual. Trocando em miúdos, “a ficha não tinha caído”.

Passei por alguns edificios da companhia durante a semana para me despedir das pessoas com as quais havia tido contato durante os dois anos e meio de trabalho. Algumas realmente deixaram sua marca em mim e pude aprender muito com elas. E, nesse momento, o adeus custa muito. Dá um aperto no coração.






Esse capítulo ainda não teve seu fim, porque me comprometi a voltar ao escritório antes da minha partida. Quero dar o último abraço nos meus colegas. Será um turbilhão de emoções. Já sei. Mas é parte das despedidas e terei que enfrentá-lo. Coragem, Marília!

domingo, 4 de abril de 2010

Limpando as gavetas


Em exata uma semana estarei engrossando a fila dos desempregados, primeiro na Argentina e, dentro de alguns dias, no Brasil. É isso mesmo, essa será minha última semana no escritório. Sexta-feira limpo totalmente minha mesa e me despeço dos amigos que fiz alí.

Aliás, essa acho que será a parte mais difícil. Durante esses dois anos e meio na companhia, pude formar com algumas pessoas um vínculo muito especial. Na quarta passada fizemos uma espécie de despedida pra mim num bar de Puerto Madero. Digo “espécie de despedida” porque ainda tenho uma semana pela frente no escritório, mas tudo vale a pena se a alma não é pequena, não é mesmo?

Foram só os mais chegados, mas eu tenho uma filosofia quando o assunto é convidados numa festa: “Estavam os que tinham que estar”, ou seja, foi bacana porque estavam eles. Quando escrevo “eles” não é generalizando, não. Realmente, eram todos homens. Isso porque durante a maior parte do tempo fui a única mulher numa gerencia composta por mais de vinte homens.


Sempre tivemos uma relação muito especial em que eu cuido deles a minha maneira e eles também cuidam de mim. Em alguns dou até puxões de orelha, mas eles sabem que é tudo com carinho. Vou me lembrar de cada um deles de uma forma diferente, mas estarão sempre no meu coração. Ao Cristian, Gonzalo, Guillermo, Gastón, Juan Carlos e Charly Fernandez (é de outra gerencia, mas é um amigão também), que estiveram presentes na quarta em minha despedida, eu deixo registrado aqui meu carinho e quero que saibam que sempre me lembrarei de vocês por onde quer que eu vá.